terça-feira, 23 de setembro de 2008

Desafinando de verdade

Eu nunca tinha ouvido falar de Os Desafinados até poucos dias antes de sua estréia aqui. E ouvi falar tão bem que não pude deixar de criar uma certa expectativa. É simples assim: o segundo melhor filme nacional que vi este ano depois de Estômago. Enquanto este último parte para o lado gastronômico, Os Desafinados é mais ou menos um musical de bossa nova que conta a trajetória de um quarteto (Rodrigo Santoro, Ângelo Paes Leme, André Moraes e Jair Oliveira, o eternamente Jairzinho) carioca em busca do sucesso nos anos 60. Eles tentarão a carreira se mudando para a Big Apple onde conhecerão uma vocalista (Cláudia Abreu) para o grupo. E ainda tem o Selton Mello, um cineasta amigo do pessoal que está tentando acabar o seu filme. Isto tudo é contado através de flashbacks porque o tempo atual acontece na velhice dos personagens. Eu achei lindo os breves momentos em que os atores jovens e velhos foram colocados na mesma cena para fazer a transição entre o passado e o presente. Foi um detalhe mínímo que aconteceu umas duas ou três vezes mas achei bem marcante.

A primeira coisa que vale citar é como o filme não parte para uma história de ascensão e decadência mesmo que você fique com esta impressão no começo. Os Desafinados, aliás, muda de rumo tão fortemente que não parece mais o mesmo filme. Fiquei um pouco incomodado, devo dizer. Mas no caminho para casa fiquei pensando como esta foi a melhor saída. Ou eles faziam algo mais Mamma Mia! (ainda não vi) ou algo mais Across The Universe. Escolheram a segunda opção. Repito. Os Desafinados é mais ou menos um musical, melhor, é um drama musical. Quando resolvem destacar a luta do cineasta do Selton para divulgar o filme, nenhum vestígio sequer de que seja musical existe. A censura caindo em cima, os militares ocupando as ruas, é a cena política daquela época sendo explorada de forma crua. E também a cultural quando mencionam a vitória do Brasil em Cannes com O Pagador de Promessas. Eu não sei se foi a direção de arte, a fotografia ou o figurino que não me convenceu de que a história se passa principalmente nos anos 60. Muita coisa ali parecia tão contemporânea. É bem diferente de O Ano Em Que Meus Pais Saíram de Férias, um viagem ao passado praticamente. O AdoroCinema classifica o filme como comédia romântica! Faz até um pouco de sentido, quando eu disse que muda de rumo, muda mesmo. O personagem do Santoro é casado com a Alessandra Negrini (sempre uma graça), ele a trai com a Cláudia Abreu que se envolve com o Ângelo depois e por aí vai. Também não entendi porque alguns foram deportados se em nenhum momento a hipótese de que eles foram ilegalmente é criada.

As canções são excelentes, só engrandecem a experiência. E o Santoro nem desafina! A Cláudia Abreu visivelmente não é a dona da voz de suas músicas. E visível também ficou o Selton dublando o ator que faz sua versão mais velha. Todo o quarteto masculino mais o Selton transmite realmente uma energia agradável e inspiradora que parece transceder a tela do cinema. Eu não falei??!! Descobri agora que o Ângelo, o André, o Jair e a Branca Lima que dá voz às canções da Cláudia resolveram seguir com o grupo e já estão até fazendo shows. Os Desafinados do filme nunca alcançaram o sucesso e é um pouco amargo vê-los na velhice, não por causa da idade, mas porque o grupo foi vítima de certas infelicidades que afetaram o seu destino. O número final é o mais forte de todos por justamente servir de referência a um passado cujas vitórias foram apagadas pelos infortúnios da vida.

Nota: *****

sábado, 6 de setembro de 2008

Vamos todos virar comida dos insetos gigantes

Chegou aqui O Neveiro que eu achei que não iria ver tão cedo principalmente por causa dos inúmeros adiamentos. Até eu tive que adiar minha ida duas vezes durante a semana. O que importa é que já assisti e foi um daqueles onde a expectativa era muito alta. O tombo existiu mas foi insignificante perante as suas qualidades. Esta é a terceira vez que o Frank Darabont dirige algo do Stephen King. As outras duas foram com Um Sonho De Liberdade e À Espera De Um Milagre. Adoro ambas. Pensando bem, gostei de todas as adaptações do King que já assisti, desde os terrores de O Iluminado e Carrie até o drama de Conta Comigo. Até Colheita Maldita de 1984 não achei ruim. O Nevoeiro é sobre um grupo de pessoas que ficam presas num supermercado depois que uma misteriosa névoa invade a região. O perigo que ela trás é o de menos quando o triunfo do filme está nos conflitos ideológicos dos personagens e nas suas duríssimas críticas ao exército americano e a uma certa parte daquela sociedade.

O problema inicial para mim foi o tempo levado para o filme ganhar forma e mostrar que não é apenas uma celebração do cinema trash. A partir do momento que a fanática religiosa da Marcia Gay Harden vai ganhando espaço, comecei a me envolver cada vez mais com o clima. E só fui conquistado de verdade pela cena final. Magnífica!!! Eu li que o Darabont mudou radicalmente o final do conto original do King que era bem ruinzinho. Quando eu penso que esperei duas horas para ficar grudado na poltrona quase sem respirar por causa da cena final, lembro que o filme decepciona um pouco no quesito suspense. Apesar de uns sustos isolados, não passei por nenhum momento alarmante. Se o terror revela desde o início como são os monstros e não deixa o público imaginar, não consigo ver o porquê de sentir medo. Eu já sei que em algum momento eles irão aparecer, atacar e matar. Mas como eu disse antes, as consequências do isolamento é o que mais importa. Diversos tipos ficam presos no supermercado e como cada um vai reagir à pressão da situação? A personagem da Marcia é a pedra preciosa daquele ambiente. Os seus discursos dizendo que o nevoeiro representa a ira de Deus por sermos pecadores, apoiadores das pesquisas em células-tronco e pró-aborto estão lá para satirizar os conservadores. Comparando o elenco em geral com o de Liberdade e Milagre, este está bem fraquinho. Embora eu ache que o elenco de Milagre tenha sido fundamental para o seu desempenho, ele não importaria tanto para O Nevoeiro desde que a religiosa não decepcionasse e a Marcia está inspiradíssima. Enfim, terror com conteúdo e referências a eventos importantes definem O Nevoeiro.

Nota: ****

terça-feira, 26 de agosto de 2008

E todos não viveram felizes para sempre

A sinopse espanta. A direção é de Breno Silveira de 2 Filhos de Francisco e você lembra que odeia música sertaneja. Então por que assistir esta maldição? Ou o que esperar de Era Uma Vez...? Que tal um filme com os assuntos mais ultrapassados possíveis e que rende ótimos momentos? É assim o resultado. Só para constar, eu gostei bastante de 2 Filhos e fiquei comovido que nem um condenado. Infelizmente este sofrimento não se repetiu desta vez e uma das propostas do diretor era criar um tearjerker como a história dos sertanejos. Eu não vi ninguém saindo chorando da sessão. Só foi uma pequena frustação minha.

Era Uma Vez... é filmão para público e digo isto no bom sentido mesmo. Tudo bem que o número de pessoas que já assistiram até agora não é animador. Rapaz de favela carioca se interessa por garota rica e vice-versa. Percebam o clima de romance socialmente inaceitável. Não para o público do cinema que torce por eles, é óbvio. A favela tem seus moradores decentes, a polícia é racista, os traficantes comandam os morros, a classe média é preconceituosa, está tudo lá como pano de fundo para interferir na história de amor. Uma das razões para o filme é funcionar é o carisma da jovem dupla de protagonistas Thiago Martins (Dé) e Vitória Frate (Nina). Ele está bem melhor do que ela até porque o filme é sobre ele. Há mais espaço para o rapaz diversificar sua atuação já que está mais em evidência. O terceiro personagem mais importante é o irmão do Dé feito pelo Rocco Pitanga. É ele quem impulsiona a melhor sub-trama da história.

O roteiro é previsível em sua maior parte. É tão proposital que não tem como não resistir. Você conhece o inevitável mas o grau de envolvimento chega a um nível em que você torce com todas as suas forças para estar enganado. E quando a tragédia acontece, a última gota de esperança que ainda restava vai embora. A sensação é desagradável, um sentimento de inaceitação cresce de tal forma que só piora quando o ator Thiago Martins narra sua breve história real durante os créditos finais.

No entanto, a relação deles tem seus momentos verdadeiramente ternos sem cair nas armadilhas dos romances colegiais feitos para as pré-adolescentes. Talvez por criar um pano de fundo mais injusto e não menos verdadeiro, o romance convence bem pois satisfaz o desejo do público de elevar o seu espírito. O destaque de cena mais hilária vai para o pai de Nina (Paulo César Grande) e o porteiro fofoqueiro do prédio. É até estranho lembrar este tipo de momento quando já se conhece o final do filme. Fica mais doloroso.

Nota: ****

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

Noites de mirtilo

Eu vinha esperando por My Blueberry Nights desde que o filme estreou em Cannes em 2007 o que dá uns quinze meses atrás. Um Beijo Roubado é o seu título nacional. Foi até uma boa saída porque traduzi-lo ao pé da letra ficaria estranho. Blueberry foi a estréia do diretor chinês Wong Kar-Wai em língua inglesa. Eu só lembrava que o Jude Law e a Norah Jones (ótima para uma cantora que nunca foi atriz) estavam no elenco, aí durante os créditos inicias aparece o nome da Natalie Portman também e achei que iria ver um novo Closer já que os filmes do Kar-Wai que conheço são todos romances. Blueberry não alcança o nível de Amor à Flor da Pele, por exemplo, mas não deixa de ser apaixonante mesmo não sendo explicitamente uma história de amor. É mais um ensaio sobre relacionamentos impossíveis e decepções amorosas. O seus pontos fortes são os diálogos e a direção do Kar-Wai que preserva a sua marca.

Norah Jones é uma moça que começa a visitar o mesmo bar todas as noites após descobrir que o local era onde o seu namorado a traía com outra mulher. Ela e o dono do bar (Jude Law) passam as noites fazendo companhia um ao outro e refletindo sobre suas vidas amorosas. Norah decide seguir em frente mudando de cidade e o filme se torna um road movie em que ela irá conhecer pessoas que transformarão significativamente aquele momento de sua vida. É onde entram David Strathairn (Boa Noite e Boa Sorte), Rachel Weisz (!!!) e a Natalie Portman. Irei omitir a ligação entre eles.

Blueberry é muito lento, tem que saber apreciar o seu ritmo. Cada situação tem seu valor, mesmo que pareça estar se repetindo. Há paisagens que eu acho fascinantes em filmes, uma delas é o ambiente urbano durante a madrugada quando não existem mais pessoas nas ruas e as luzes dos postes acesas iluminando o asfalto para ninguém. Tem uma cena em que a Norah e a Rachel conversam num ambiente exatamente assim, sem falar que o momento é bem delicado. A gente fica esperando que a Norah revele algo mas, como é um filme do Wong Kar-Wai, a cena é direcionado de outra forma e ela não fala nada. Eu gostei da melancolia refletida pelos personagens e suas ações surpreendentes nos finais de suas histórias. Eu achei bem interessante como o Kar-Wai põe uma espécie de barreira entre a câmera e os personagens. Ao filmar o Jude Law conversando com sua ex-namorada, a câmera está dentro do bar, os atores fora e o vidro com letreiros no meio. É uma característica mantida em várias cenas. Talvez seja para transmitir mais intensamente para o espectador a idéia de que ele seja um mero observador do filme. E imagino também que seja uma representação para os obstáculos que os personagens têm que vencer porque todos ali estão buscando por algo mas antes uma barreira precisa ser ultrapassada.

Tenho visto mais filmes do que minha disposição para escrever permite. Talvez eu escreva sobre Hancock que acabei vendo logo depois de Batman. A coisa é tão ruim que ainda não esqueci. Também vi Persépolis e fiquei babando.

Nota: ****

sábado, 26 de julho de 2008

Todo herói tem sua crise existencial

Um colega me perguntou se eu iria assistir Hancock e respondi que não porque só aguento o Will Smith uma vez por ano. E a cota dele se esgotou lá em janeiro com Eu Sou A Lenda. Já o Christian Bale é outra história e ele faz parte da minha lista de atores e atrizes que me fazem ver um filme só por causa da sua presença. Naturalmente esta não foi a única razão para ter assistido o novo Batman, inclusive foi a menor delas. Hancock foi feito para reinventar o gênero mas os primeiros roteiros possuiam cenas tão apelativas que até foram cortadas depois. Mesmo assim, eu ainda posso viver sem a história do herói bêbado. O Cavaleiro das Trevas mostrou que não é necessário seguir um rumo diferente para fazer um filme excelente de super-herói. Eu achei ótimo de verdade mas não é a obra-prima que achei que fosse.

O diretor Christopher Nolan ressucitou o herói em Batman Begins de forma brilhante após as duas palhaçadas feitas pelo Joel Schumacher. Só estou repetindo o que dizem por aí sobre as versões do Joel já que não assisti nenhuma. O que mais gosto no Begins é ironicamente o início, tudo o que leva o Bruce a se tornar o homem-morcego, deve ser os 60% iniciais do filme. O resto é só o Batman combatendo o crime daquela trama. Pois o estilo apresentado neste resto de Begins foi intensificado e amadurecido para ser tornar a sequência. Foi como se aqueles 60% não estivessem presentes no Cavaleiro. Eu achei que poderia analisar o novo Batman como um filme que transcende o gênero dos super-heróis mas me enganei. O Cavaleiro das Trevas não deixa de ser um filme de super-herói. O seu diferencial é por não ser apenas uma exibição de efeitos especiais, não subestimar a inteligência do espectador e ter o Coringa, o melhor vilão que deve existir - pelo menos para mim que não conheço nada de quadrinhos.

Gotham City está tomada pelos mafiosos que são combatidos não somente pelo verdadeiro Batman mas também por uma legião de seguidores do Morcego que se fantasiam como o seu ídolo. O Coringa, um ladrão de bancos a princípio, faz uma parceria com os mafiosos para juntos matarem o Batman. Só que o Coringa joga sozinho, ele é uma espécie de personificação do caos. Enquanto o Homem-Aranha só questionou sua existência no terceiro filme (ou foi no segundo que ele já se cansou?), o Batman do Nolan passa pela mesma situação de crise existencial no segundo. Ele se sente responsável pelas mortes de inocentes e abandona o uniforme. Mas por pouco tempo, é óbvio. Gotham também tem um novo promotor público e os fiéis companheiros do Batman continuam na sequência. Acho que não existe um filme deste gênero com um elenco tão ótimo como os dois Batman do Nolan. Morgan Freeman e Michael Caine repetem seus papéis e adoro a importância deles para a vida do Bruce Wayne. O policial do Gary Oldman também. Katie Holmes não pôde participar deste (felizmente), Maggie Gyllenhaal assume o seu lugar de Rachel, a paixão de infância do Bruce. Dentre todos os personagens, Rachel é a menos explorada e parece um pouco perdida dentro da história. O Aaron Eckhart é o novo promotor e gostei da visão que tiveram para não deixá-lo para o próximo filme. Tem que assistir para entender o porquê.

Heath Ledger é o que há de melhor! É extraordinário pensar que o sucesso financeiro do filme foi por causa dele. A recepção da crítica teria sido a mesma se o ator ainda estivesse vivo mas a euforia do público não. Na fila quilométrica que enfrentei, as pessoas só falavam do ator que já morreu. Ele era a maior razão para eu ver este filme (não por causa da morte) e depois por ser a terceira parceria entre o Christopher Nolan e Christian Bale. Eu lembro que a primeira vez que vi o trailer de Cavaleiro foi num cinema e aquela imagem da cabeça do Heath maquiada em close me deu um aperto no coração de susto. Foi aí que começou a minha expectativa. Este Coringa é uma mistura de loucura e sanidade incrível. Em certos momentos a maquiagem está tão pesada que ele consegue atuar só com o olhar. A voz e a postura não lembram nada o ator. Este tipo de vilão é tão mais interessante do que os outros concorrentes. Também gostei do Lex Luthor do Kevin Spacey. A cena do Coringa saindo do hospital já é antológica. Outra decisão sábia foi não ter explicado a origem dele. Acho que tiraria o espaço das ótimas cenas presentes.

O título original do filme é apenas O Cavaleiro das Trevas, não contém a palavra "Batman" como no título nacional. É como se o público brasileiro precisasse de ajuda para saber que se trata de um filme do Batman. E também não entendi porque deixaram o título do anterior sem tradução quando poderiam ter colocado Batman - O Início.

O filme é muito bem executado, a direção do Christopher é segura mas tem uma cena do Batman, sua moto e uma parede que provocou risos pelo motivo errado. Não chega a ser constrangedora mas é engraçada. Aliás, filme de herói rico parece ser mais divertido. Não acho que o Peter Parker seja mais humano do que o Bruce Wayne só porque tem que trabalhar.

Nota: *****

sábado, 12 de julho de 2008

Fim do Shayamalan?

Fui contra a maré e aprovei o mais recente Shayamalan. A sacada é encará-lo como uma divertida sátira aos filmes de catástrofe que tentam analisar profundamente seus personagens mas sem êxito. As atuações em Fim dos Tempos são medíocres, os dialógos toscos e alguns acontecimentos absurdos. Não acredito como muita gente levou isto a sério e odiou o filme. Apesar de tudo, o Shayamalan não faria algo tão ruim sem deixá-lo aberto a outras interpretações. Não vou opinar sobre A Dama na Água porque não vi. É como assistir A Vila e querer que ele seja um terror, não vai funcionar. Esperar que Fim dos Tempos tenha um final surpreendente é a mesma coisa. O barato é se divertir com as caras ridículas do Mark Wahlberg. Por favor, ele é um excelente ator. Nem o pior diretor do mundo seria capaz de dirigi-lo tão mal. O que gosto no M. Night, além de ser um diretor autoral, é que depois de O Sexto Sentido, todos os seus filmes foram encarados como um evento independente de você gostar dele ou não. Quem não gosta vai lá ver só para falar mal. Ele consegue ser assunto. O roteiro foi escrito durante o auge do documentário do Al Gore logo este é o mais ecológico e fica fácil de adivinhar quem é o vilão da história. As pessoas de uma cidade começam a agir de forma estranha até que cometem suicídio. Suspeita-se que um ataque químico esteja acontecendo. É hora de abandonar a cidade! O Mark Wahlberg é um professor que foge com a esposa e um amigo também professor com sua filha. O casamento não vai nada bem. Já percebeu que vai rolar discussões sobre o relacionamento nos momentos mais inapropriados. Adorei uma parte em que eles encontram do nada um rádio pendurado numa cerca de uma fazenda durante a fulga e usam para saber das notícias sobre o ataque. Totalmente sem noção. O elenco de apoio de civis também em fulga é um show a parte. Nem dá para decidir quem faz a melhor expressão de medo. Há um diálogo impagável do Mark com a esposa em que ele começa a contar sobre uma moça que deu bola para ele, história para fazer ciúmes. O texto é tão ridículo e inacreditável que só me resta pensar que tudo no filme é ruim intencionalmente. E nem é preciso dizer que eles irão redescobrir o amor no momento de maior perigo. Não é o que acontece sempre? O suspense característico do Shayamalan está lá mas desta vez parece que ele está parodiando a si próprio o que se encaixa naturalmente. Uma coisa é certa, assim como A Vila, Fim dos Tempos não é vendido da forma que ele deve ser visto.

Nota: ****

terça-feira, 8 de julho de 2008

Cuidado com o que você come

Estômago é a estréia em longas de ficção do diretor Marcos Jorge e o rapaz já veio chamando a atenção já que o filme foi o grande vencedor do Festival do Rio de 2007. Pude assisti-lo há uma semana atrás quase sem querer numa sessão tripla com Chega de Saudade e Shine A Light. Mal sabia o que estava perdendo. Estômago deve ser a maior surpresa do cinema nacional. Não é nenhuma obra-prima mas já começa valendo por fugir dos temas abordados constantemente. Ele não se passa em favela, não tem casais da classe média carioca discutindo o casamento e não faz humor de apelo sexual ambientado no interior nordestino.

Um rapaz do interior abandona sua terra para tentar a vida na cidade grande. Logo ele descobre seu talento para a culinária, se apaixona por uma prostituta e acaba na prisão. Achei Estômago bastante original. Seu começo é um longo monólogo sobre o queijo gorgonzola. Hã? E as muitas situações bem humoradas envolvendo comida? Todas funcionam (ou quase todas). São principalmente estas situações que carregam o filme. E ele é dividido em duas linhas narrativas que são contadas paralelamente. Sua chegada à cidade grande e à prisão são mostradas mais ou menos ao mesmo tempo. Enquanto vemos sua vida atrás das grades, a outra sequência vai narrando os fatos que o levaram a ser preso. Mas ambas são unidas por pontos comuns descritos pelas transformações sofridas pelo protagonista de um ser vulnerável em um novo ambiente para alguém capaz de realizar uma ação que ninguém esperava que ele fosse capaz. Seu nome é Raimundo Nonato, interpretado pelo ator João Miguel que eu ainda não conhecia mas já tem uma ótima filmografia. Talvez por eu não conhecê-lo, achei algumas de suas cenas tão naturais que pensei que ele não estivesse atuando. Fazia umas expressões faciais que pareciam deixá-lo envergonhado. Engano meu. Foi tudo intencional e estava fazendo o personagem. Sem falar que o João Miguel já foi bastante premiado.

Estômago diverte mesmo, além de ousar e esbanjar criatividade. Há uma cena em que a iluminação é tão artística. A atriz que faz a prostituta entra nua numa cozinha sem iluminação, se dirige à geladeira e abre sua porta o que faz com que a luz do aparelho revele o seu corpo. O relacionamento dela com o Raimundo é uma mistura de sinceridade com amargura. Você torce por eles mas o destino dos dois é incerto. E para não fugir da proposta do filme, eles começam o relacionamento porque ela se encanta com a coxinha dele. E o macarrão nem se fala.

Nota: *****

quarta-feira, 2 de julho de 2008

Onde está Wall-E?

O que resulta recesso escolar mais animação da Pixar – dublada? Uma fila gigantesca formada por famílias inteiras e muita gente sem poder entrar porque a lotação máxima foi atingida. Fui um dos últimos a conseguir entrar na minha sessão e, é lógico, peguei um dos piores lugares. O melhor de tudo é que Wall-E compensou todo o sacrifício. É sério, já estou achando que é a minha animação preferida do estúdio batendo até Procurando Nemo que eu adoro. Gostei muito de Ratatouille no ano passado e ainda preciso rever porque eu estava com a cabeça longe naquele dia. Wall-E não é tão divertido quanto Nemo mas possui elementos que o torna mais marcante e por que não um dos melhores filmes do ano? E este é infinitamente superior ao Robôs da Fox de 2005.

Desta a vez a Pixar avança 700 anos e cria uma realidade em que a humanidade não vive mais na Terra e os robôs são os únicos trabalhadores. O nível de poluição e lixo atinge um nível tão absurdo que é impossível morar no planeta. A população restante vai viver numa nave gigante – de fazer inveja àquela do clássico do Kubrick e naturalmente Also Sprach Zarathustra é tocada em algum momento – que vagará pelo espaço enquanto robôs são deixados na Terra para fazer a limpeza. Nem eles dão conta do trabalho e Wall-E é o único robô “sobrevivente”, tão solitário. Vive colecionando objetos abandonados pelos humanos. Will Smith em Eu Sou A Lenda não está com nada. Enquanto este tinha um cão como companheiro, o robô tinha uma barata. Perfeito, não? Certo dia, um outro robô chamado de Eva é deixado no planeta por uma espécie de nave que, por enquanto, a gente não sabe o que é. Wall-E se apaixonará por ela. Um detalhe é que Eva foi desenhada pelo maior designer da Apple, grande parceira da Pixar. Não é gratuita a aparição de um iPod no filme. Eu gostei de como os sentimentos dados aos robôs não ficaram forçados principalmente por eles se distanciarem da forma física humana. É como criarmos uma relação afetiva com um quadrado. É claro que o quadrado possui algo com função de olhos, por exemplo, mas não passa disto. Está mais relacionado ao seu comportamento. Eu me diverti muito com o robozinho da limpeza.

A gente percebe a grandeza do filme quando os humanos entram em cena. Imagine gerações e gerações que só nascem para comer e dormir. É uma ótima sátira ao avanço tecnológico e ao comodismo exagerado. Infelizmente são duas coisas diretamente proporcionais e querer separá-las não parece estar nos nossos planos.

Eu sou bem pessimista em relação à preservação do meio-ambiente. Eu imagino um futuro cheio de calamidades onde as condições de vida vão se tornando cada vez mais escassas. Mas será que é mais fácil criar um novo ambiente fora da Terra do que reverter o mal já existente? O filme impulsiona estas discussões. Quantas verdades inconvenientes são necessárias para salvar o planeta? Espero mesmo que o público infantil que vá ver Wall-E tenha sua consciência ecológica despertada.

A direção dele ficou com o Andrew Stanton, o mesmo de Procurando Nemo e elogiar o trabalho dos animadores é chover no molhado.

Nota: *****

terça-feira, 1 de julho de 2008

Vivendo para dançar

Ainda não vi Bicho de Sete Cabeças, o primeiro longa-metragem da diretora Laís Bodanzky que recebeu dezenas de prêmios. O seu segundo longa Chega de Saudade me chamou logo a atenção há alguns meses por lembrar O Baile do italiano Ettore Scola, filme que eu tinha visto há pouco tempo e achado bastante curioso. A diferença é que o filme da Laís tem o salão de baile como pano de fundo para o desfile dos seus personagens: pessoas da terceira idade, cada uma com sua história que será explorada nos 90 minutos do filme. Há casais passando por problemas conjugais, solteiras procurando um relacionamento, ciúmes e traições mas tudo se resume ao simples ato de viver.

A produção acontece toda dentro de um salão desde a chegada do público enquanto o sol ainda brilha até o seu final tarde da noite. A música rola solta ao som de muito samba, bolero, forró e Elza Soares em carne e osso. Eu gostei bastante da agilidade inicial do roteiro de Luiz Bolognesi (marido da Laís) ao apresentar os personagens e seus principais traços. Mas a partir de um certo ponto, ele se torna repetitivo e pára de avançar. E o final do baile veio de forma brusca. Já a direção da Laís é uma aula. É maravilhoso como a câmara dança junto com aquelas pessoas no salão. Ela faz um passeio sempre destacando o que enche os olhos do espectador. Direção e roteiro foram, inclusive, os dois prêmios que Chega de Saudade levou no último Festival de Brasília.

Nota: ****

segunda-feira, 30 de junho de 2008

Pedras que não param de rolar

Desde quando Shine A Light é documentário? Se eu soubesse do que se tratava nem teria ido assistir. Não é nada contra os Rolling Stones, eu até gostos deles, fazem parte da lista dos músicos "cool", etc. Mas o que o filme vai acrescentar? 90% dele é somente o show! Os três minutos iniciais são os bastidores da criação dos dois shows e breves entrevistas antigas são exibidas entre as canções. Para quem não conhece as músicas, depois da metade se torna extremamente exaustivo. Eu lembro que um colega me perguntou "Sabe alguma música dos Stones que não seja Satisfaction?" na época do show em Copacabana. Se o filme fosse com o U2, por exemplo, uma banda que gosto mais e conheço mais músicas, teria sido mais agradável sem dúvida mas injustificável do mesmo jeito que Shine A Light.

O Mick Jagger chamou Martin Scorsese para documentar toda a turnê mas o diretor preferiu uma abordagem mais intimista. O resultado foi que Scorsese acabou dirigindo dois shows parecendo que foram direcionados apenas para os fãs da banda. No começo, ele mostra sua preocupação em posicionar as câmeras para capturarem as melhores imagens. E isto ele consegue. Aliás, tecnicamente o show é impecável. Você se contagia com as primeiras canções, com a vitalidade do Jagger, os convidados Jack White e Christina Aguilera não decepcionam. As entrevistas em vários momentos da carreira deles são ótimas mesmo, escolhidas com muita convicção. É uma pena que são mínimas.

Nota: ***

sábado, 31 de maio de 2008

Beatles para todas as ocasiões

Eu iria até ver Homem de Ferro e Speed Racer se não fosse a minha preguiça então um jejum forçado de três semanas resultou somente num único post no mês de maio!! Mas finalmente entrou aqui Across The Universe, o musical baseado nas músicas dos Beatles. O filme foi quase uma aula porque não sabia que algumas daquelas músicas eram do quarteto de Liverpool. E se eu sabia, havia esquecido. Across The Universe tem seus defeitos mas é tão adorável que não vou conseguir ser negativo. É um filme inofensivo e prefiro lembrar dele desta forma. Vou divido-lo em duas partes: a.B. e d.B., antes de Bono e depois de Bono. Achei que depois da participação do líder do U2, o filme perdeu bastante o ritmo.

A primeira parte funciona melhor porque é a parte mais fácil do roteiro com os personagens sendo apenas apresentados, os números músicas contagiantes moldando a estrutura do filme, a narrativa criando forma, etc. É a base de tudo. Jude (Jim Sturgess que meses depois seria mais visto em Quebrando A Banca) é um artista inglês que decide ir aos EUA durante a década de 60, auge da guerra do Vietnã. Lá conhece várias pessoas, uma delas é a Lucy (Evan Rachel Wood) por quem irá se apaixonar. Em NY, dividirão um apartamento com outros novatos na Big Apple. A Lucy é a mais engajada com o pacifismo já que o seu antigo namorado foi convocado pelo exército. Inclusive ela já demonstrava este lado quando explicou a origem do feriado de Ação de Graças ao Jude. É muito divertido como as canções dos Beatles vão se encaixando com todas as cenas. Bem, isto é natural já que ninguém seria louco de escrever toda a história antes e só depois procurar as músicas que se encaixassem. Os números musicais são bastante variados. Tem desde o Jim apenas cantando para a câmera quando abre o filme até aqueles com toques psicodélicos como o da sala de boliche. Nenhum deles são grandiosos já que o objetivo, acredito eu, tenha sido focar a simplicidade, criatividade e até criar uma poesia visual. E nesta primeira parte o filme cumpre seu papel com excelência.

Quando os conflitos são introduzidos, os personagens parecem perdidos num tiroteio e alguns deixam de ter uma função na história. Seguem-se sequências de ações sem motivações que tiram o gosto agradável da primeira parte. A idéia de abordar de forma mais séria não convence. Neste quesito, Hair é infinitamente melhor como um ato pacifista. Acho que Across não faz despertar o desejo de se juntar àquela multidão para lutar pelo mundo ideal. O gosto amargo persiste por bastante tempo até que perto do final o filme se recupera ao som de Hey Jude e All You Need Is Love. Chega até a levantar o seu astral. E pela falta de Twist And Shout, a gente percebe que Ferris Bueller a imortalizou e seria um sacrilégio reusar a canção.

Nota: ****

segunda-feira, 5 de maio de 2008

Senhores da Saúde

Mais uma sessão dupla no fim de semana resulta em um post único. Independente de suas visões políticas, o Michael Moore sabe fazer um documentário que prende a atenção do começo ao fim. Talvez por isso muitos achem que ele é melhor cineasta do que um documentarista. Ainda não vi Tiros em Columbine mas gostei bastante do Fahrenheit 9/11. Sicko é tão arrasador quanto o anterior. Tem o característico humor ácido que o Michael incorpora em assuntos sérios. Desta foi foi a decadência do sistema de saúde americano. Na verdade, nem é a decadência já que o tal sistema nunca funcionou. Fala principalmente dos interesses econômicos dos planos de saúde e da autonomia que o governo Bush deu às indústrias farmacêuticas para venderem os medicamentos pelo preço que quiserem. O Michael ainda visita a Inglaterra, França e Cuba e descobre a “gratuidade” dos sistemas de saúde nestes países. O documentário está cheio de casos reais absurdos. O depoimento que mais me afetou foi a de uma funcionária de um serviço que informa cotações de preços dos planos. Ela relatou o caso de um casal que ficou aliviado por achar que conseguiu um plano de saúde mas ela, a funcionária, sabia que em alguns dias o pedido do casal seria negado e ela não podia falar nada. É de partir o coração. Mas o fato mais inacreditável é o que aconteceu com o dono do maior site anti-Michael. Só assistindo para saber do que se trata. Mal vejo a hora de ver o que o Michael vai atacar em seguida.
Nota: *****

Estive esperando por Senhores do Crime desde setembro de 2007 quando vi o trailer e achei fantástico. Aí corri para assistir a parceria David Cronenberg/Viggo Mortensen em Marcas da Violência que ainda não tinha visto. Gostei mais da segunda metade dele. Senhores do Crime já começa ganhando porque as duas metades são equilibradas. Mas confesso que fiquei só um pouquinho desapontado. Embora eu tenha gostado bastante, senti que faltou alguma coisa que também não sei dizer o que seria. O Viggo está espetacular e o seu personagem, um mafioso russo, transmite um ar enigmático que persiste mesmo depois do final da sessão. A Naomi Watts também está ótima. Eu gosto dela pela sua diversidade. Os seus papéis em, por exemplo, Cidade dos Sonhos, O Chamado, O Despertar de uma Paixão, King Kong e 21 Gramas são tão diferentes e ela não decepciona em nenhum deles. A Naomi faz em Senhores uma parteira que irá investigar o passado de uma garota que morreu durante o parto e o seu possível envolvimento com os mafiosos. Eu adorei a narração do diário da garota durante o filme. O estilo violento explícito e chocante do Cronenberg está lá. Não basta cortar a garganta do rapaz com uma navalha em um único movimento, ele tem que serrar. Uma moça ao meu lado se incomodou. E quando a garota grávida sangra entre as pernas, ela deixa a sala de cinema. Acho que não custa nada se informar um pouco antes de ver o filme. É um Cronenberg, então vai ter sangue. Bem, minha experiência com o diretor só envolve dois filmes e vendo o making-of de Marcas da Violência, percebi que ele gosta de sangue, de como seus personagens morrem, etc. Mas havia alguém bem informado atrás de mim pois ele falou “É agora” quando a sauna apareceu. O fato interessante é que Senhores do Crime seria a mesma coisa sem a violência? Acho que não. É como Os Sonhadores sem o sexo. Não funcionaria. E mais ainda, a violência de Senhores não se torna gratuita. É um grande filme e possui umas reviravoltas bem sacadas no final.
Nota: ****

segunda-feira, 21 de abril de 2008

A vida de Sweeney Todd num orfanato

O cinema alemão tem produzido verdadeiras preciosidades nos últimos anos como Adeus, Lênin (2003) e Edukators (2004). Sou muito fã destes dois, principalmente do segundo que deve ser um dos meus preferidos de todos os tempos. Agora vi A Vida dos Outros, vencedor do Oscar de filme estrangeiro em 2007. Em termos comparativos, prefiro Lênin e Edukators por serem mais leves. A Vida é muito denso e exige certa concentração para acompanhar mas não deixa de ser genial mesmo assim. O ministro da Alemanha Oriental ordena que a vida de um escritor de peças seja observada por acreditar que ele tenha "tendências ocidentais". O encarregado de executar as tarefas de escuta terá o seu compromentimento com o trabalho (lealdade ao governo) abalado após o início das observações. É aí que está a grande sacada do filme. Como é que um homem casado com os trabalhos de interrogação do regime ditatorial amolece ao penetrar na vida de um cidadão e sua esposa? O fato mais curioso é que eu não estava achando A Vida um grande filme até um simplório detalhe nos instantes finais que fez mudar toda a minha concepção. Eu estava gostando, só não estava fascinado. Anos depois, o escritor em questão lança um livro e a sua dedicatória é o que faz de A Vida dos Outros um filme realmente lindo.
Nota: *****

Eu acho o terror espanhol tão superior ao asiático e as suas refilmagens americanas. E fico mais convicto disto após ver O Orfanato. Ele não tem o mesmo valor artístico que O Labirinto do Fauno (que não é uma produção 100% espanhola) mas a ótima recepção da crítica é bastante justa. O filme tem todos os clichês possíveis do gênero e o mais interessante é que funcionam! O Orfanato assusta de verdade. Fazia tempo que eu não lacrimejava de medo. A produção tem o dedo do Guillermo del Toro e naturalmente o seu nome é o mais destacado nos pôsteres de divulgação mesmo ele sendo apenas um dos quatro produtores. Eu nem vou mencionar nada da trama porque saber detalhes demais tirariam o charme. Eu apenas sabia que era a história de uma mulher (Belén Rueda de Mar Adentro) que planeja reabrir o orfanato onde cresceu e ela tem um filho que possui amigos imaginários. Um dos grandes triunfos do filme é o desfecho do seu maior mistério. Eu queria que não fosse apenas uma série de cenas para dar sustos. Mas o final é realmente satisfatório. E emocionante. Os eternos amantes do Chaves ainda têm uma razão para ver O Orfanato já que o Edgar Vivar (Sr. Barriga) faz uma participação. E aquela imagem do menino com o saco na cabeça...
Nota: ****

Sweeney Todd é o resultado do que Tim Burton sabe fazer melhor. Todas as características que o tornaram um grande diretor estão neste musical trágico. E o clima é pesado. A fotografia mais monocromática reflete perfeitamente o tom fúnebre da obra. É tudo tão caprichado desde o figurino até a Londres vitoriana. Fica repetitivo elogiar o trabalho técnico do filme. Fico pensando em alguma coisa que não tenha gostado mas não consigo achar. No final não fiquei com aquela vontade de ver novamente como Hairspray. Mas não acredito que isto seja um comentário negativo. Gostei das músicas, do elenco (Depp, Carter, Rickman, Spall e Cohen), dos exageros da história. Os assuntos abordados como o desejo de vingança do Todd, o amor oculto da Sra. Lovett, a cobiça do juíz, o interesse do jovem marinheiro pela garota prisioneira estão todos em perfeita sintonia. Sweeney Todd é um musical estranho e com sangue que não pára de jorrar.
Nota: *****

sábado, 19 de abril de 2008

O assassinato de Charlie Wilson

Vou juntar dois filmes em um único post porque não fiquei empolgado para escrever sobre eles, embora tenha gostado muito do primeiro. Há uma semana, assisti O Assassinato de Jesse James pelo Covarde Robert Ford com o Brad Pitt fazendo o Jesse, o primeiro grande e idolatrado fora-da-lei americano. Mas acho que o protagonista seja o Robert Ford (Casey Affleck). Pelo menos, o seu personagem é o mais enigmático e interessante. E o Casey é quem está melhor em cena mesmo. Então não foi surpresa o Brad ter sido deixado de lado nas indicações aos prêmios no começo do ano. Assassinato é extremamente longo e deixa transparecer isto ao focar exaustivamente as histórias dos membros da gangue do Jesse. Um filme com este título deixa a impressão de que todo o enredo será voltado ao assassinato e suas motivações mas não é bem assim. O lado positivo é que o elenco de coadjuvantes também está excelente então o filme não se torna um martírio. A parte que mais gostei foram os instantes que antecederam a morte do Jesse. Ele pega o jornal que não deveria, Robert e o irmão não podem esperar mais... É uma tensão bem sutil. Depois o filme se estende por algum tempo parecendo que não vai acabar nunca mais.
Nota: ****

O segundo foi Jogos do Poder. Não tenho como falar de um filme que não foi feito pra mim. Eu até já sabia que poderia não conseguir acompanhá-lo quando vi o trailer. É muita complexidade para a minha pobre cabeça, não consegui entrar no clima das piadinhas sarcásticas. Ele é altamente político e não perde tempo para explicar o que você já deveria saber. Como eu não sabia, fiquei perdidinho e ainda dormi bastante. Charlie Wilson (Tom Hanks) foi um congressista do Texas responsável por induzir o governo americano a armar o Afeganistão contra os soviéticos durante a Guerra Fria. Entram na jogada a Julia Roberts que não entendi sua função na história e o Philip Seymour Hoffman, um dirigente de uma divisão específica da CIA.
Nota: ***

quarta-feira, 9 de abril de 2008

Viva a Igreja da 3ª Revelação

Se Sangue Negro não for melhor que os Fracos dos irmãos Coen, é tão ótimo quanto este. Acho que o filme do Paul Thomas Anderson (de Magnólia - que ainda não vi e tenho certeza que seria perdoado de tal pecado pela Igreja da 3ª Revelação) tem a vantagem de ser mais eletrizante no sentido de provocar reações mais fortes. Algumas sequências são de encher os olhos graças aos excelentes trabalhos do Daniel Day-Lewis e Paul Dano, uma trilha sonora pertubadora e montagens belíssimas. Tudo isto em quase 160 minutos que raramente se tornam cansativos. O primeiro diálogo só é dito uns 15 minutos depois do início do filme (11:33 para ser exato). O explorador Daniel Plainview (Day-Lewis) de minas de prata encontra petróleo e decide mudar de ramo. Parece que a única atividade que dava dinheiro no final do século XIX e começo do XX naquela região desértica da Califórnia era extrair o tal líquido. Daniel recebe informações de um certo lugar onde o petróleo parece pedir para ser extraído e decide ir investigar com o seu filho. Lá ele se instala e começa o seu negócio mais lucrativo. A sua ganância e o conflito com o pastor local (Paul Dano) são os aspectos centrais de Sangue Negro.

Eu achei fantástica a sequência com o poço de perfuração expelindo o gás e entrando em combustão. O acidente é importante porque vai mudar a relação do Daniel com o filho devido ao que acontece com o garoto, só achei que faltou mostrar a reação da comunidade local em relação ao incidente. Imaginei que haveriam protestos. Tecnicamente falando, a montagem é riquíssima. Agora pude comprovar porque a trilha sonora (composta pelo Jonny Greenwood do Radiohead) foi bastante elogiada. A composição que toca nesta sequência é hipnotizante e tão intensa que você sente um alívio quando termina. É interessante como Onde Os Fracos Não Têm Vez deve ser seco mesmo e Sangue Negro funciona por optar pelo contrário. Sangue tem muito mais efeitos sonoros, além da trilha sonora.

O Daniel atua tão bem que fiquei tentando achar um ponto de identificação com o seu personagem. Acredito que ele não tenha uma natureza perversa. Desde que você não atrapalhe os seus negócios, sua vida está salva. Foi o que aconteceu quando o possível irmão dele surge no meio do filme. Já o desprezo pelo filho no final não me conveceu. Não acredito que o garoto só tenha sido usado pela imagem. Nunca é tarde para fazer um protesto político mas se Sangue Negro tivesse sido lançado no auge da invasão ao Iraque, seria tão mais voraz.

Eu nem sabia que o Paul Dano era um ator tão ótimo. Ele passa metade do Pequena Miss Sunshine mudo mas já percebi muito talento ali. Inclusive, vi no ano passado um filme pavoroso chamado The King com o Gael García Bernal em que o Paul fazia um filho de pastor. Mas em Sangue Negro, o cinismo do seu pastor da Igreja da 3ª Revelação é impagável. E ele batizando o Daniel e devolvendo as bofetadas? Achei hilário. Até lembrei de uma sessão de exorcismo numa Igreja Universal aqui perto de onde moro. Sempre passo pela frente dela e uma vez estava ocorrendo o exorcismo de uma moça. As sátiras de Sangue Negro a estes cultos são divertidas de verdade. É tão gratificante quando um diretor faz um filme ambicioso e consegue cumprir sua tarefa.

Fui conferir a trilha do filme e fiquei desapontado (e muitos outros pelos comentários postados na Amazon.com) pela falta da composição mais marcante tocada em Sangue Negro. Aí descubro que ela foi composta para outro filme, também pelo Jonny.

Nota: *****

segunda-feira, 7 de abril de 2008

Mulher também usa armadura

Histórias sobre monarcas não me atraem muito então vejo sem o compromisso de querer gostar. Mas se eu gostar, encaro como uma surpresa. E foi o que aconteceu com Elizabeth – A Era de Ouro. Não é que eu queira agora pendurar um quadro dela no meu quarto mas é um filme bem agradável. Há um ano atrás foi a vez de Maria Antonieta que eu até devo ter gostado. Mas A Era de Ouro é bem melhor que o filme da Sofia Coppola e um pouco melhor também que o Elizabeth anterior que mesmo tendo visto somente há pouco tempo, não lembro mais do que ele aborda especificamente. A Era de Ouro foi a época em que a Inglaterra, governada pela rainha protestante, lutou contra a imposição do catolicismo pelo rei Felipe da Espanha. Ou você se tornava católico, ou acabava conhecendo o diabo mais cedo. A Inglaterra foi o único país que não se converteu.

Cate Blanchett retorna, 10 anos depois, ao papel que a deixou famosa mundialmente. Só vê-la explorando todas as nuances do personagem já vale o ingresso. Geoffrey Rush também continua como o seu conselheiro e o Clive Owen agora é visto com outros olhos pela rainha. Além da Guerra Santa, o filme trata, talvez este seja o ponto principal, sobre o título de Rainha Virgem da Elizabeth. Tem até um concurso de pretendentes e quem chama a sua atenção é o velejador-conquistador-pirata-não-sei-mais-o-que feito pelo Clive. Mas a relação está longe de ser amorosa porque nem a rainha sabe o que sente por ele. A cena em que ela descobre o caso do Clive com uma de suas damas é ótima. O medo da chegada dos espanhóis e a sua vida pessoal ser afetada por traições a deixam transtornada. E traição se pagava com o pescoço, pelo menos quando se trata de assassinar a rainha.

O que mais gostei mesmo foi a firmeza da Elizabeth em lutar contra o fanatismo religioso do rei espanhol. Há uma parte onde ela fala algo parecido com lutar pelo direito de crença do seu povo. Tudo bem que este direito só se refere ao protestantismo mas pelo menos ela está lutando contra a imposição de uma religião dita como a salvação. É até uma imagem marcante quando ela aparece de armadura em seu cavalo. Já a única coisa que me incomodou foi a falta de uma estrutura política que fizesse a rainha tomar decisões porque durante o filme todo a sua única decisão é lutar ou não contra o domínio católico. E a marinha inglesa vence a guerra. Será que ela não erra?

A direção foi mais uma vez do indiano (?) Shekar Khapur que utiliza alguns movimentos de câmera bem caprichados.

Nota: ***

terça-feira, 1 de abril de 2008

É melhor pular

Se você, assim como eu, não tinha escolha a não ser ver Jumper, meus pêsames. Se puder, pule mesmo. Espere a programação da próxima semana ou veja algum filme novamente. Eu queria ter revisto os Fracos porque descobri que não tinha percebido um detalhe importantíssimo. É vergonhoso. Como foi em cima da hora, tive que prestigiar a ficção-científica dos saltadores. A idéia é bastante inspiradora, só que está tão mal aproveitada e mal explorada que fico com a impressão de que o público alvo seja a garotada de até 12 anos. Uma anomalia genética permite que alguns individuos possam se teletransportar para qualquer parte do planeta desde que já tenha estado no lugar antes ou visto através de uma fotografia. Há os caçadores de Jumpers chamados de Paladinos que pregam a onipresença exclusiva de Deus. Os saltadores seriam como as bruxas durante a Inquisição o que não deixa de ser uma analogia interessante. Mas o que poderia ser um filme promissor (um novo Matrix?), não passa de uma história sem graça focada num protagonista mais sem graça ainda que tem uma vida também sem graça e uma namorada... sem graça. Seguindo esta lógica, nem preciso dizer o que achei do caçador-chefe de Jumpers. E quando tudo parecia perdido, veio a salvação!

O protagonista da história é o Hayden Christensen (Anakin Skywalker). Ele pode ser qualquer coisa menos ator. Ainda na época colegial sofrendo nas mãos dos colegas, ele descobre o seu poder e a primeira coisa que faz é fugir de casa e viver roubando bancos porque, é claro, é o sonho de qualquer garoto. Ele leva esta vida fácil por oito anos. Foi difícil aguentar isto no filme. Qual é o sentido em mostrar o Hayden fazendo um refeição no topo da esfinge no Egito? É o tipo de coisa que faz com que a gente não leve este filme a sério. Depois somos apresentados ao Samuel L. Jackson que entendi ser o chefe dos Paladinos. Vem ação pela frente porque ele vai perseguir e tentar matar o Hayden até o final do filme. Os Paladinos pregam que somente Deus pode estar em vários lugares ao mesmo tempo mas como eles têm uma máquina de teletransporte? Vale negar os próprios conceitos para acabar com um Jumper? Pfff.

A Rachel Bilson (The O.C.) é o interesse romântico do Hayden. Eles não se vêem há anos e quando o Hayden decide visitá-la no bar onde a moça trabalha, ele a convida para ir a Roma. Ela aceita na hora sem questionar. A Rachel está melhorzinha que o Hayden mas o seu papel é tão chatinho. Não dá para entender como ela aceita os segredos do seu namorado. E sua única função é só servir de isca. Todos os filmes de heróis têm isso. O Hayden, na verdade, um anti-herói. Mas sua imoralidade em viver roubando dinheiro é tão bobinha. Em sua jornada, ele conhece a única salvação do filme: o Jamie Bell (o eterno Billy Elliot)!

O Jamie também é um Jumper, só que um experiente em fugir. É muita covardia colocar o Hayden para contracenar com o Jamie. Este é um grande ator desde criança. Ele nunca fez um papel tão importante como o Billy Elliot mas o seu talento não foi perdido. Até já vi uma boa quantidade de filmes com ele e arrisco dizer que em Jumper ele faz o seu melhor trabalho (depois do Billy, é claro. O melhor filme depois do Billy é o Querida Wendy). O seu Jumper tem um sarcasmo excelente, é cativante em todos os momentos e coloca todo elenco embaixo do tapete. Só por causa dele, fui cativado pelos efeitos especiais na sequência de cenas em que ele e o Hayden ficam brigando pelo detonador.

Coitado do Doug Liman. Dirigiu a Identidade Bourne (!!) e depois só vem sendo rebaixado. Sr. E Sra. Smith não é tão ruim mas Jumper não tem justificativa. A sequência já foi confirmada para 2011 mas só irei ver se for centrada no Jamie Bell.

Nota: **

terça-feira, 25 de março de 2008

Where the weak ones have no chance

Minha experiência com os irmãos Coen antes de Onde Os Fracos Não Têm Vez se resume a apenas três filmes: O Grande Lebowski (*****), Na Roda da Fortuna (*****) e Gosto de Sangue (****). Todos vistos em 2008 e os asteriscos são as notas que coloquei aqui no meu arquivo. Nada mal porque Fracos vai levar também 5 estrelas (e bem merecidas!). É o melhor filme que vi nos últimos seis meses. Uma excelente aula de cinema. A ansiedade era tanta que eu vibrei com os dois primeiros assassinatos do Javier Bardem que abrem o filme. Eu só estava um pouco preocupado por causa da polêmica sobre o seu final ser insatisfatório mas achei o roteiro brilhante. O final não é fácil mesmo. É o mais cru que lembro de ter visto num filme. Quem ficou com o dinheiro? Para mim foi o Josh Brolin. Não conheço o livro do Cormac McCarthy então só estou supondo. Ouvi uns chiados das pessoas no fim da sessão. A aparente ausência do destino dos personagens foge dos padrões mas acho isto atraente. Não vá esperando ver o xerife comemorando por ter colocado o bandido atrás das grades.

A história é sobre um caçador (Josh Brolin) que acha um belo malote de dinheiro e o assassino frio Anton “Sugar” Chigurh (Javier) é enviado para recuperar os dólares. Tommy Lee Jones é o xerife que segue os rastros de maldade deixados pelo Sugar. O espanhol Javier Bardem (Mar Adentro, Carne Trêmula) está assustador de verdade. E nem é por causa do cabelo. Sua personificação deste monstro já se imortalizou na história do cinema assim como Hannibal Lecter em O Silêncio dos Inocentes. Parece que estes dois vilões liberam o nosso lado sádico. Se você não tem este lado como eu, vai sentir da mesma maneira um certo prazer pelas maldades nas duas horas do filme. A única coisa que não gostei no Javier foi a sua voz de Darth Vader. O Josh também fez um trabalho expecional e ainda tem a Kelly Macdonald (que fez Trainspotting quando era novinha) como sua esposa. Não há o que reclamar do elenco individualmente e é melhor ainda quando estão contracenando. É uma maravilha ver os personagens serem construídos em camadas. O Javier atuando com o dono da loja, com o Josh, com a Kelly... Cada um deles representa uma camada que vai adicionando algo em nossa percepção sobre o Javier com o passar do tempo. Isto vale para outros personagens. Pegue todas as pessoas com quem o Josh Brolin atuou e você vai perceber também sua construção complexa. Só depois percebi que o Javier não matava todo mundo que cruzava o seu caminho. Normalmente ele costuma usar uma moeda para decidir. Parece absurdo mas se encaixa perfeitamente com sua mente psicótica. Alguns sabem domar a fera como a dona dos trailers e o Sugar a deixou viva sem consultar sua moeda. Mas no fundo eu queria que ele acabasse com ela. Há uma cena hilária de um grupo de mariachis cantando para o Josh, a fulga vai parar no México.

Deveria ser proibida a entrada de pessoas com alimentos barulhentos (=pipoca). Aquele longo e silencioso início no deserto do Texas ao som de crack-crack não é muito agradável. Aliás, o filme todo é assim seco, sem trilha sonora, lento. Eu achei fascinante esta narração árida quando vi A Criança dos Dardenne. Parece que tudo fica mais intensificado. Os momentos de suspense de Fracos são de primeira. Quem quase não teve um ataque cardíaco quando o Javier arromba a porta do quarto do Josh? Fracos explora um pouco de vários gêneros igualmente sem partir para um específico. É suspense, terror, ação, até lembra um filme noir. Nenhum estilo fica devendo ao outro. Perto dos Coen, os fracos não têm vez.

PS: Uma semana depois, descubro que entendi o filme todo errado.

Nota: *****

segunda-feira, 17 de março de 2008

Shiva, o Deus dos advogados honestos

Foi uma benção ter entrado Conduta de Risco, assim eu pude fugir de 10.000 a.C. já que a experiência só com o trailer dele foi sofrível. Conduta ainda não é o que mais quero ver e nem sei o que escrever sobre ele pra falar a verdade. Eu gostei mais ou menos porque achei confuso. As subtramas da vida do Michael Clayton (George Clooney) me atrapalharam. Não compreendi a história dele com o restaurante e nem com a família. Já a linha de desenvolvimento central foi mais fácil de seguir. Eu não gosto muito de filmes sobre advocacia, a área em si não me atrai. O lado bom é que Conduta não é um filme com cenas de tribunal como Um Crime de Mestre (se bem que gostei deste). Está mais para um suspense investigativo em vários momentos. Conduta serve melhor como instrumento para grandes atores mostrarem o que sabem fazer. As três indicações ao Oscar de atores são justificáveis.

George Clooney trabalha numa empresa de advocacia cujo objetivo é limpar a sujeira de seus clientes. Para entender até que ponto isto pode chegar, o Tom Wilkinson, um advogado também da empresa, foi à loucura após passar os últimos seis anos limpando o nome de uma companhia de produtos agrícolas acusada de utilizar substâncias cancerígenas. A Tilda Swinton (a feiticeira das Crônicas de Nárnia) é uma espécie de conselheira da companhia em questão. Os melhores momentos de Conduta são quando estes três atores estão se confrontando. Os diálogos são bastante afiados e aquela narração do Tom Wilkinson logo no início já prova isto. Foi dele que eu gostei mais. Tendo assistido este filme agora, eu nunca apostaria na vitória da Tilda para atriz coadjuvante. Ela tem uma presença de cena incrível mesmo só enxugando o suor das axilas. Queria que seu personagem tivesse uma participação maior.

Conduta foi escrito e dirigido pelo Tony Gilroy (assumiu a direção pela primeira vez e muito bem) que também trabalhou nos roteiros da trilogia Bourne (!). Em relação ao roteiro, só não gostei da criação de um clima de suspense na cena com o rapaz instalando uma bomba no carro do Clayton. O Clooney vem se aproximando e será que o rapaz vai sair do carro a tempo? É claro que vai! A cena já foi mostrada no começo do filme.

Que interessante! Acabei de ler uma sinopse do filme que esclareceu todas as minhas dúvidas. É óbvio que não irei mudar o meu primeiro parágrafo.

E para terminar este post que escrevi só para arquivar Conduta de Risco, assisti também No Vale das Sombras do Paul Haggis. O filme não é ruim mas não merece um texto. Quero ver o que entra na próxima semana.

Nota: ***

terça-feira, 11 de março de 2008

A pipa do vovô não sobe mais

A adaptação de O Caçador de Pipas deve ser a maior de um best-seller depois de O Código Da Vinci. A diferença é que o Caçador não poderia gerar um blockbuster. E isto explica a passagem discreta dele pelos cinemas. Algumas pessoas que conheço amaram o livro, outras nem tanto. Fui para o filme conhecendo o básico: dois garotos e amigos afegãos vivem felizes em Cabul nos anos 70, algo irá romper a amizade, um deles foge para os EUA com o pai, etc. É uma pena dizer que odiei quase tudo neste filme e nem é por ele ter sido o responsável por eu ter perdido a liderança num bolão do Oscar. E fui com tanta boa vontade assisti-lo! Deve ser difícil fazer uma amizade honesta entre duas crianças sem adicionar pieguices. Para mim ficou bonitinho demais. Lembrei agora daquele A Cura com o Brad Renfro que está descansando em paz. Ou não. Prefiro a amizade destes dois de A Cura do que a do Amir e Hassan no Caçador. Por enquanto, esta é a parte feliz da história. O lado delicado vem com um bully (valentão) que atormenta o Hassan por ele ser um hazara. Não tem toda aquela segregação étnica mostrada em Hotel Ruanda? Aqui é parecido, só que sem as guerras civis. A discriminação só ficava nas palavras (pelo menos é o que está no filme).

Mesmo com campeonatos de pipas, idas ao cinema e declarações quase amorosas (juro que não estou sendo maldoso porque se eu acredito na pureza da amizade dos hobbits da Terra-Média, não tenho motivo para fazer piadinhas com os afegãos) de um garoto para o outro, um mal estar vai destruindo a relação deles. Até agora eu não consegui entender a razão que levou ao rompimento. E não fui só eu! Pude ouvir as conversas de pessoas que perguntavam ao vizinho por que os garotos agiam daquela forma. Às vezes, eu nem sabia quem era o Amir e o Hassan, quem era o filho de quem. O Amir ficou decepcionado porque o colega preferiu ser fiel e acabou sendo estuprado? E por que o próprio Amir não interveio e impediu os valentões? Não dá para negar que é arrasador quando vemos o Hassan assumindo o roubo do relógio que ele não cometeu mas eu não conseguia acompanhar tais atitudes. Pode ser lerdeza minha. Parece que o roteiro não quer perder tempo moldando o caráter dos personagens.

Há duas cenas que considero marcantes durante a infância deles. A primeira é o estupro do Hassan que eu não fiquei chocado, só aquele sangue pingando na neve enquanto o garoto caminhava é que me causou um pequeno impacto. O curioso que não foi por pena dele e nem por raiva do bully. Como posso sentir raiva de um personagem mal construído que já entra em cena implicando? A outra cena marcante é quando o Amir fica jogando os tomates no Hassan pedindo para ele reagir e tudo o que este consegue fazer é esfregar um tomate na própria cara. Foi o momento mais sensível de todo o filme e o único que considero verdadeiro. O problema é justamente querer ser sensível demais. Parece que quer forçar o público a se comover. Em algumas cenas eu imaginava um letreiro gigante sobreposto piscando "CHOREM! CHOREM!". É claro que não estou menosprezando os horrores pelos quais estas crianças passaram. Só acho que para transformar isto num filme não precisa de exageros melodramáticos. Pois bem. Após humilhações e traições, os garotos perdem o contato. E com a ocupação soviética, Amir e o pai são obrigados a fugir do Afeganistão e vão para a América.

Começa a vida adulta do Amir (que é um dos terroristas do EXCELENTE Vôo United 93). Não tem muito o que falar sobre esta parte. Ele termina uma faculdade, se casa com a filha de uma família de afegãos que também vive na Califórnia e se torna escritor. Não dá para deixar de notar as tradições de repressão contra a pobre moça. Era só um aperitivo do que estaria por vir quando Amir volta a sua terra natal. Achei bem desnecessária a cena em que o pai dele sai do consultório porque o médico é russo. Eu só ri porque fui influenciado pelos outros. A pior parte vem a seguir quando Amir recebe um telefonema que o faz voltar ao Afeganistão em 2000.

O regime talibã está tomando conta do país. Então, a princípio, Amir vai ao Paquistão. É só colocar uma barba e um turbante que os talibaneses permitem a entrada no Afeganistão. O motivo da viagem de Amir logo ganha um novo sentido quando um segredo é revelado, digno de qualquer novela mexicana. Imagine quando Guadalupe conta ao seu filho Pedro Daniel que Jorge Luiz não é o seu verdadeiro pai. Amir é obrigado a repensar em tudo de mal que causou ao amigo de infância. A mensagem moralista da história é que nunca é tarde para se redimir. Somos obrigados a aturar isto por longos minutos enquanto vemos Amir em várias situações que o fará “corrigir” os erros do passado. As cenas de agressões físicas, perseguições e tiroteios não se encaixam na proposta do filme. Agora o pior momento de todos é a cena do apedrejamento da mulher adúltera para mostrar os horrores do regime talibã. Por que ela está lá se todos já conhecem os absurdos pregados por estes radicais extremistas? Se o filme não vai condenar, ela nem precisa estar lá. Também não está defendendo as práticas. Acredito que ser neutro é motivo de orgulho para o regime fundamentalista.

Nem vou mencionar o elenco do filme, olha o nome de um dos atores: Sayed Jafar Masihullah Gharibzada. Mas vou colocar os principais nos marcadores como sempre. A adaptação foi dirigida pelo Marc Forster de A Última Ceia e Em Busca da Terra do Nunca. Ainda não vi ambos. Eu tenho um certo fascínio pela região desértica do Oriente-Médio e com a ótima trilha sonora do filme dá para apreciar alguma coisa que não teria como somente lendo o livro.

Nota: ***

quarta-feira, 5 de março de 2008

Versão feminina de Ligeiramente Grávidos

Eu achei que fosse gostar bastante de Juno devido ao que aconteceu com Pequena Miss Sunshine em 2006/2007. Eu sabia que eram histórias distintas mas ambos foram distribuídos pela Fox Searchlight Pictures, tiveram um excelente desempenho nas bilheterias, foram um sucesso de críticas, receberam um Oscar pelo roteiro original e ganharam como melhor filme no Independent Spirit Awards. Como sou muito fã de Miss, estive empolgado durante meses por Juno. Pois é, não vi nada de mais nesta história da garota grávida. Não é que eu não tenha gostado de nada, apenas devo esquecer de tudo (exagero?!) nos próximos dias mesmo com aquela música chiclete da abertura. Não me causou nenhum impacto.

Juno (Ellen Page) é uma garota diferente de todas as outras. A gente está cansado disso, não? Acho que a personagem funcionou pelo ótimo trabalho da Ellen (eu nunca lembraria que ela esteve em X-Men). Sua Juno é carismática até a alma e acredito que o sucesso de público do filme foi ocasionado pela atriz. É maravilhoso como ela reflete a inocência e a maturidade nunca única pessoa. Mas não gostei de tudo nela. Certo dia ela resolve transar com seu melhor amigo/namorado (é um relação confusa mas simpática) e fica grávida. O garoto é feito pelo Michael Cera de Superbad. Ah, essa foi mais uma razão para assistir Juno. Estava ansioso para ver qualquer um da dupla de amigos num novo trabalho. Só que o Michael aqui não tem muito o que fazer.

Então Juno percebe que não tem coragem para fazer um aborto e decide ter o bebê para dar a um casal que não pode ter filhos. Jennifer Garner e Jason Bateman (da série Arrested Development) fazem o casal. Não sei se fui eu que não entendi os seus papéis mas eles me incomodaram do começo ao fim por não ter a certeza do porquê eles querem tanto o bebê da Juno. Juro que ainda acho que a Garner poderia ser chefe de uma quadrilha de tráfico de crianças. Não dá para entender se o que eles falam é verdade. Eu não confiaria nunca neles.

Não entendo porque todo este alarde em relação a Diablo Cody, ex-stripper que escreve um roteiro e ganha um Oscar. Qual é o problema em ter trabalhado (ou trabalhar) com sexo? Eu acho a Bruna Surfistinha inteligentíssima. Desde quando esta atividade é falta de inteligência por assim dizer? Aí eu me pergunto também se a Diablo foi premiada pela Academia porque sua protagonista desiste de um aborto. O prêmio de roteiro original era dela antes mesmo do anúncio mas parece que Juno dura mais de três horas.

Se eu tiver que destacar mais alguém do elenco além da Ellen, eles devem ser o J.K. Simmons, pai, e a Allison Janney (único trabalho no cinema em 2007 foi Hairspray), madrasta, da Juno. Gostei de como eles reagiram à gravidez dela e do ambiente familiar “esquerdista”. A cena em que eu mais entendi a Juno é quando ela brinca com um carrinho sobre o seu barrigão. Aparentemente é uma cena comum mas eu a classificaria como definitiva.

Eu defendo Juno (direção do Jason Reitman do ótimo Obrigado Por Fumar) apenas como um filme despretensioso e até divertido. Querer elevá-lo a um certo patamar de glorificação é exagero.

Nota: ***

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

Eu seguro melhor a câmera

Os críticos que foram generosos com Cloverfield dizem que o melhor do filme foi o fato de terem deixado o monstro como pano de fundo para a história dos personagens. Eu concordo perfeitamente com a afirmação. O problema é que a história dos personagens é muito, mas muito, menos interessante do que ver o distrito de Manhattan sendo destruído. Sinta o drama. A mensagem do filme é que uma catástrofe serve para que os pombinhos descubram o amor de um pelo outro. Parece que esta mensagem e a falta da mitologia do Clover não agradou o público. Exemplificando com o Brasil: o filme estreou em segundo lugar, na semana seguinte caiu para décimo primeiro e agora está em décimo nono. O boca-a-boca esperado não aconteceu. Acho que aconteceu o efeito inverso com as pessoas convencendo os amigos a não perderem tempo com este Godzilla fajuto. Ocorreram as mesmas quedas bruscas nos EUA. Existia um certo hype ao redor dele o que justifica a boa estréia. Há meses sua propaganda vinha sendo feita, através da internet também. A Bruxa de Blair não teve os mesmos meios de divulgação que os produtores de Clover (o badalado J.J. Abrams é um deles) tiveram e mesmo assim Bruxa foi um tremendo sucesso porque o boca-a-boca aconteceu. Até hoje nunca assisti Bruxa (tem a sequência que ninguém viu), por isso Clover foi minha primeira vez com um filme contado através da câmera de um dos personagens. E não fiquei com náuseas!

Cloverfield não ganharia mais pontos se o monstro nunca fosse revelado? Eu preferia deste jeito. Eu gostei muito da cena onde apenas a calda do bicho aparece partindo a ponte no meio. É aterrorizante. Mas a cada cena, mais detalhes dele vão sendo revelados até chegar o momento em que o seu rosto fica em close. Se é para mostrar tudo, então explicasse o que aconteceu com ele, de onde veio, etc. Epa! Acabei de descobrir que já está marcada uma continuação para 2009... Isto é motivo para eu desgostar mais da primeira parte.

Seria melhor também se seguisse o exemplo de Vampiros de Almas. A primeira adaptação para o cinema do livro Invasores de Corpos foi dirigida pelo Don Siegel em 1956 e ganhou o título de Vampiros de Almas. Tinha toda a questão implícita nele da perseguição aos comunistas pelo senador Joseph McCarthy. Vampiros funciona quando você o enxerga desta forma. E Cloverfield reflete os ataques do 11/9? Se sim então não faz sentido mostrar o Exército mandando bala no monstro. Do jeito que ficou, só aproveitei mesmo as cenas de destruição quando não sabia ainda a forma da criatura. E só vou creditar nos marcadores o diretor e o T.J. Miller que é quem segura a câmera porque o vi no David Letterman.

Nota: ***

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

Escondam o microfone do gângster

Eu não estava muito disposto para enfrentar um filme com mais de 150 minutos. Mas O Gângster do Ridley Scott é tão envolvente que você lamenta quando acaba. As ótimas atuações de Denzel Washington, Russell Crowe e elenco, um roteiro sem enrolações e a firmeza do Scott fazem do Gângster um filme imperdível, principalmente com as opções atuais por aqui. É a história verídica de Frank Lucas (Washington), negro americano que passa de motorista ao maior comerciante de heroína dos EUA na década de 70. O negócio de Frank é o melhor porque ele não tem um fornecedor, recebe direto a mercadoria do produtor asiático trazida clandestinamente nos aviões do exército americano no Vietnã. Assim ele pode vender mais barato e ter mais prestígio do que os concorrentes brancos da máfia italiana, sem mencionar o fato da droga ser 100% pura. A coisa foi tão lucrativa que Frank somou uma fortuna de 250 milhões de dólares. Na contramão, temos Richie Roberts (Crowe), o policial mais honesto que você possa imaginar. Richie será encarregado de comandar uma equipe (uma espécie de Intocáveis) que vai combater somente contra o grande tráfico.

É bom ver como o filme não se trata apenas de uma luta entre polícia e bandido dentro dos valores que conhecemos. Enquanto Richie se orgulha de sua honestidade ao recusar dinheiro do tráfico e denunciar os colegas corruptos, ele não consegue a guarda do filho. Frank pode ser frio e violento mas a primeira coisa que faz quando começa a encher o bolso é dar uma casa para a mãe (Ruby Dee). Tem também o Josh Brolin (espero ansiosamente por Onde Os Fracos Não Têm Vez) que faz o lado corruptível da polícia. É só receber uma boa quantia todo mês do Frank e todo mundo fica em “paz”. A Ruby está magnífica no pouco tempo que está em cena. Até vou torcer para ela no próximo dia 24 mesmo sem ter visto ainda as outras concorrentes de atriz coadjuvante. E querer conhecer os indicados antes da premiação não é algo possível morando aqui.

Os anos antes da queda do império do Lucas foram uma espécie de época de ouro para os comerciantes e consumidores. Imagine ter três quartos dos policiais de Manhattan envolvidos não somente com as organizações do tráfico como também tirando uma grana extra através de outros meios. Não é à toa que Frank pode matar ao ar livre em plena luz do dia e sair andando como se nada tivesse acontecido. O Gângster tem cara de filme violento mas até que está bem dosado. Só o último tiroteio no prédio de produção da Lucas Inc. foi um pouco desnecessário, parece que foi para seguir a fórmula. Há uma cena que ainda não esqueci de um bebê chorando na cama e sua mãe morta ao lado de overdose.

Nunca vi um microfone aparecer tanto no topo da tela como neste. O lado positivo é que num filme como O Gângster, isto é um mero detalhe insignificante.

Nota: ****

terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

Que lenda?

A lenda do título é referência ao filme do Will Smith e não ao do Nicolas Cage. Aliás, este último é a continuação de uma primeira parte que nunca ouvi falar. É um horror em quase dois meses só ter ido assistir três filmes. As opções aqui estão péssimas. Há um ano atrás, foi a vez de À Procura da Felicidade que não achei lá essas coisas. Agora o astro de início de ano vem com Eu Sou A Lenda que achei bem pior. Nunca assisti muita coisa do Will Smith, seus quatro últimos vi com certeza. Por enquanto, ele fica me devendo. A premissa deste mais novo parece interessante. O ator sozinho em uma Big Apple abandonada. Isto daria um filme bastante profundo mas Lenda não passa de um filme de luta com monstros (vampiros mais modernos) que não param de rugir quando encontram o Will.

Um vírus que prometia ser a cura do câncer causa a morte de 99% da população mundial. Will faz um cientista imune (não lembro o porquê) ao vírus e pesquisa a cura enquanto tem Nova Iorque aos seus pés. Os humanos infectados ficam raivosos e sensíveis à luz (por que uns morrem e outros viram monstros? Não prestei atenção). Enquanto ele tinha o filho como parceiro em Felicidade, agora o garoto cedeu a vez a um cachorro pastor-alemão. Lembrei até da cena do Will com o filho no banheiro do metrô quando apareceu ele agora com o seu cão numa banheira. Lenda falha em tentar mostrar o cotidiano do protagonista. Como gastar o tempo do filme só tendo um ator para dirigir na maior parte? Tem o Will se exercitando, dando banho no cachorro, conversando com manequins... Achei mais interessante ficar pensando se eu fosse o último sobrevivente do planeta (sem monstros). Preencheram o tempo com alguns flashbacks mas eu colocaria tudo como um prólogo. E eu nem achei os ângulos escolhidos pelo Francis Lawrence (Constantine) para mostrar NY vazia tão deslumbrantes. Mas gostei do Will jogando golfe em cima da asa do avião.

Há momentos bem irritantes. O maior deles é o “Damn it, Fred!!”. Fred é um manequim que o Will encontra e discute achando que é um humano. Depois ele manda bala no boneco. Dá para entender que viver naquela situação o individuo pode enlouquecer mas que é irritante ver o Will gritando com um boneco, isto é. Ele chega a conversar com outros manequins numa locadora mas esta cena é simpática. Todas aparições dos monstros são brochantes. Eles nem são assustadores. Acontece que há umas partes em que eles entram em cena de repente e os efeitos sonoros aumentam. São os típicos sustos de suspense meia boca.

Alice Braga surge depois da metade do filme como uma sobrevivente que ouve a transmissão que o Will envia todos os dias na esperança de alguém captar. Coitada. É triste só ser lembrada pelo papel de alguém que nunca ouviu falar do Bob Marley. É uma cena constrangedora. Tal capacidade de não conhecer o Bob se sobressai ao papel importantíssimo da atriz no desfecho da história. Lamentável.

Nota: **

quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

Qualquer recuperação é viável

Mais um filme nacional está fazendo bonito nas bilheterias brasileiras. Permanecer três semanas em cartaz aqui em Maceió e com sessões bem cheias é um grande mérito. Eu já tinha gostado do trailer de Meu Nome Não É Johnny antes. Agora que vi o produto completo, posso afirmar que é melhor ainda. A história baseada em fatos reais - a grande propaganda do filme está justamente na divulgação de que é uma história verídica - conta a vida de João Guilherme Estrella, rapaz da classe média carioca que se tornou o maior comerciante de drogas do Rio entre os anos 80 e 90, foi julgado e reintegrado à sociedade em 1997. Hoje trabalha como cantor, produtor e compositor de música. João tem até dado umas entrevistas recentemente por causa do filme. Por não fazer julgamentos e não querer dar lições de moral, gostei bastante do filme. Até porque o João não é retratado como um dependente químico, ele foi usuário também mas entendi que o vício não chegou a se tornar um problema. Enquanto Trainspotting e Réquiem Para Um Sonho (meus preferidos sobre drogas) focam o consumo, Johnny destaca o comércio então não o vejo tanto como um trabalho educacional. Johnny trata mais de assuntos como a situação do sistema carcerário, policiais civis corruptíveis e de uma possível facilidade em comprar o pózinho branco.

O filme começa bem chatinho com a infância e adolescência de JGE mas felizmente acho que nem chega a durar quinze minutos. Já crescido, Selton Mello entra em ação encarnando o protagonista. Ele não trabalha, só vive de festas em seu apartamento onde as substâncias ilícitas são permitidas, tem um pai doente, a mãe (Júlia Lemmertz) foi embora... Um certo dia, Johnny tem a chance de negociar com um fornecedor e acaba levando jeito para a coisa. Quando seu primeiro fornecedor é preso, de quem ele vai pegar agora? Da Eva Todor! São situações assim que vão impulsionando o filme porque, no fundo, a maior parte dele é uma grande diversão. Não é tão divertido como pretende ser mas há realmente alguns momentos hilários. A fama de Johnny vai se espalhando e os negócios vão se tornando mais lucrativos chegando a ter compradores estrangeiros. Não sei se é a vida que ele sempre quis, mas com certeza é uma etapa de onde ele quer tirar o maior proveito. Cléo Pires faz sua namorada mas não é uma parceira de crime, apenas testemunha e consumidora. A Cléo está melhor do que eu esperava, talvez seu personagem tenha ficado um pouco nebuloso. Será que ela amava de verdade o João ou só queria torrar a grana em Barcelona e Veneza? O elenco coadjuvante está excelente. Há muitos desconhecidos e a Cássia Kiss que faz a juíza que decidirá o futuro de JGE após ele ter sido convidado a ver o sol nascer quadrado.

O drama deixa de lado as razões que o levaram ao envolvimento com as drogas. Entendi que ele se envolveu porque quis sem nenhuma pressão exterior. A gente vê um certo desequilíbrio familiar no começo mas acredito que não seja justificativa. Isto me lembra o irregular Aos Treze com a Evan Rachel Wood que prega o contrário: a falta de uma estrutura familiar é o fator responsável pelo "mal comportamento" dos nossos adolescentes. Ainda bem que Meu Nome Não É Johnny não explora nada disso, João nem é rebelde. Está mais para vendedor de peixe. É sério! Abriu uma peixaria e vendia os bichos recheados.

Quando Johnny é preso, pode parecer que o filme perderá o ritmo mas isto não acontece. Algumas cenas no presídio e no hospício parecem fictícias mas o que importa é que o público se divertiu bastante. Acho que estão lá só para criar um equilíbrio com o tom mais sério do descaso com os detentos e da superpopulação. Não pude deixar de notar que o João era o único branco na cela e ali do lado havia a cela só para africanos. Será que precisava disso? As cenas das audiências estão ótimas graças as atuações de Cássia Kiss e Selton Mello. O momento mais terno é quando ele desabafa dizendo que desconhecia o que é fora e dentro da lei (é marcante no trailer). A juíza feita pela Cássia é a autora da frase exibida no final que resume tudo o que acabamos de assistir. Ela diz que o caso do João Guilherme mostra que qualquer recuperação é viável. Outra grande cena é ela em seu apartamento refletindo sobre a sentença. Direito pode ser uma ciência exata? Eu acho assustador o destino de alguém estar nas mãos de uma determinada pessoa.

Mauro Lima assumiu a direção desta produção baseada no livro de mesmo nome. Ele foi o produtor de Lisbela e o Prisioneiro que também tem o Selton e dirigiu anteriormente Tainá 2. Ainda é um novato no ramo e teve seu nome mais exposto agora devido à história de Johnny Starr.

Nota: ****